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Catadores de recicláveis são essenciais para economia circular, mas seguem sem reconhecimento

Catadores de recicláveis são essenciais para economia circular, mas seguem sem reconhecimento

Pesquisa mapeou iniciativas no Brasil e no exterior propondo diretrizes que integrem os catadores de material reciclável à gestão de resíduos na transição para economia circular
Catadores de recicláveis são essenciais para economia circular, mas seguem sem reconhecimento
Estima-se que entre 15 e 20 milhões de pessoas no mundo atuam informalmente como catadores de recicláveis – Foto: Fora do Eixo/Flickr
Apesar de muitas vezes invisíveis e sem reconhecimento social, estima-se que entre 15 e 20 milhões de pessoas no mundo atuam informalmente como catadores de recicláveis, segundo a rede global WIEGO, que apoia trabalhadores do setor informal. São eles que coletam, separam e comercializam materiais como papel, vidro, metais e plásticos, evitando que toneladas de resíduos sejam destinadas a aterros, rios e mares. Reconhecendo essa contribuição socioeconômica e ambiental, uma pesquisa da USP analisou experiências no Brasil e no exterior, ouviu catadores e lideranças e elaborou diretrizes para orientar governos, empresas e organizações do terceiro setor na criação de políticas de integração desses trabalhadores. O objetivo foi propor uma transição justa para a economia circular — modelo que prolonga a vida útil dos produtos, incentiva novos formatos de negócio e favorece o desenvolvimento sustentável.
Mulher branca sorrindo, cabelos e olhos castanhos. Usa blusa branca com o logotipo da USP, fundo cinza desfocado.
Ana Maria Rodrigues Costa de Castro - Foto: Lattes

A autora do estudo é a engenheira ambiental Ana Maria Rodrigues Costa de Castro, que defendeu tese na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP sob orientação do professor Valdir Schalch. A pesquisa foi realizada em três etapas: revisão de literatura, mapeamento de iniciativas de integração em diferentes países (Índia, Quênia, África do Sul, Colômbia, Brasil e Canadá, dentre outros); análise de experiências de organizações no Canadá e Estados Unidos; e estudo de casos brasileiros. 

A pesquisadora avalia que, embora distante do ideal, o Brasil está à frente de outros países, com reconhecimento legal da atividade, leis de inclusão e algumas parcerias entre catadores, Prefeituras e empresas.

Para Schalch, “apesar dos avanços no Brasil, os desafios persistem”: a maioria dos municípios recicla menos de 3% dos resíduos urbanos e grande parte das cooperativas e associações de catadores segue sem contratar e remunerar esses trabalhadores. Mesmo aquelas que já conquistaram acordos enfrentam dificuldades constantes para renovar e atualizar os contratos.
Homem branco de cabelos grisalhos usando camisa branca. Fundo cinza.
Valdir Schalch - Foto: Unaerp
“As diretrizes propostas no estudo são essenciais para garantir direitos humanos aos catadores de material reciclável e estão alinhadas ao programa Pró-Catador, lançado pelo governo federal em 2023 para fortalecer a categoria e ampliar sua inclusão na cadeia da recicláveis da economia circular”, diz o professor.

Entre os bons exemplos de integração no Brasil, Ana Maria destaca o Pimp My Carroça, organização que atua para melhorar as condições de trabalho e a qualidade de vida dos catadores autônomos. O projeto promove ações como a pintura de carroças para reduzir a estigmatização, a criação do aplicativo Cataki, que conecta catadores à população para facilitar a coleta, programas de capacitação e o Pimp Educa, que contrata catadores para realizar palestras e ações de educação ambiental.

Experiencias internacionais

A revisão de estudos mostrou que pesquisas sobre integração de catadores se concentram no Sul Global, especialmente na América Latina, responsável por 68% dos resultados, onde existem políticas públicas específicas e forte mobilização social.

Entre 39 iniciativas internacionais de coleta seletiva e triagem realizadas pelos municípios, apenas 13 previam remuneração. Para Ana Maria, isso evidencia que, embora essenciais, os catadores ainda não são reconhecidos como trabalhadores. “Muitas vezes, a atividade é tratada como doação de resíduos, quando na verdade se trata de um serviço ambiental que deveria ser pago”, afirma. O estudo também identificou oito experiências de logística reversa no exterior voltada para grupos organizados, envolvendo maior participação do setor privado.

Ana Maria lembra o depoimento de um integrante de uma organização de catadores no Canadá, cuja trajetória a fez refletir sobre o potencial transformador da atividade. Ex-morador de rua, ele iniciou sua atuação como catador e, quatro anos depois, tornou-se gerente da fundação onde trabalhava.

    “Eu estava em situação de rua e trabalhava apenas três horas por semana. Hoje sou gerente da fundação e coordeno vários projetos. A mensagem que passo aos binners e diverters, como os catadores são chamados na região, é que é possível superar adversidades. Uso meu exemplo para mostrar que há caminhos possíveis”, relatou.


Texto: Ivanir Ferreira
Arte: Gustavo Radaelli*

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