Mapeamento revela desigualdade no acesso a cirurgias no Brasil, apesar de o País contar com número suficiente de oftalmologistas
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Um terço da população hoje com mais de 60 anos já teve diagnóstico de catarata em um ou em ambos os olhos – Foto: rawpixel.com- Freepik |
“Um terço da população hoje com mais de 60 anos já teve diagnóstico de catarata em um ou em ambos os olhos. No Brasil, nós ainda temos um grande número de pessoas com catarata, mas que não receberam o diagnóstico, e muitas das que estão diagnosticadas não conseguem realizar a cirurgia em tempo adequado.” O professor comenta que a catarata é a principal doença ocular que causa cegueira, mas que a maioria das cirurgias é relativamente simples.
Apesar de o País contar com cerca de 17 mil oftalmologistas — uma média de nove especialistas por 100 mil habitantes, proporção semelhante à de países desenvolvidos —, a concentração desses médicos é desigual. “Os oftalmologistas reproduzem um padrão de outros estudos nossos da demografia médica de outras especialidades. Eles estão mais concentrados em Estados do Sul, do Sudeste, em grandes centros. Aqui em São Paulo nós temos 11 a 12 oftalmologistas por 100 mil habitantes. É inadmissível a existência de filas de cirurgia de catarata aqui no nosso Estado”, aponta Scheffer.
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Mário Scheffer – Foto: Marcos Santos/USP Imagens |
Papel dos planos de saúde
A diferença também aparece entre setores. O estudo mostra que, embora o SUS seja responsável pelo maior volume em números absolutos de cirurgia de catarata, os planos de saúde realizam 73% a mais do que a rede pública quando levamos em conta a taxa por 100 mil habitantes. Para Scheffer, não há falta de médicos, mas má distribuição. “É preciso olhar para esses dois níveis de desigualdade, entre o público e o privado e entre as regiões, para que a gente possa melhorar o acesso da população. Eu diria que é possível o SUS zerar a fila de cirurgia de catarata no País”, defende. O estudo indica que 65% de todos os especialistas estão concentrados em apenas 48 cidades com mais de 500 mil habitantes.
Recentemente, houve a implementação do programa federal Agora Tem Especialistas. Entre as ações desenvolvidas estão a ampliação de mutirões, o uso de unidades móveis de saúde (carretas), a aquisição de transporte sanitário e o fortalecimento da Telessaúde. Essas medidas contribuem para garantir mais agilidade, eficiência e equidade no acesso à saúde especializada. Para o professor, a curto prazo o programa é positivo: “É adquirir, comprar essa capacidade do privado”; contudo, ele aponta a medida como paliativa: “É preciso ter um planejamento de médio e de longo prazo, para que os especialistas que existem e foram formados, em sua maioria, com bolsas públicas de residência médica, com o campo de prática nos serviços públicos do Sistema Único de Saúde se aproximem mais da maioria da população”.
O professor encerra com um recado otimista: “Eu não tenho dúvida que o SUS, o mesmo Sistema Único de Saúde que garantiu antirretrovirais para todas as pessoas com HIV e que tem o maior sistema público de transplante do mundo é capaz de zerar a cirurgia de catarata. Agora precisa, com a palavra e com a prática, da ação dos gestores públicos que são os responsáveis pela implementação da política”.
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