Três desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho acusados de participar de grupo criminoso que, em troca de propina, atuaria para incluir empresas e organizações sociais em um plano especial de execução da Justiça do Trabalho, foram condenados. O colegiado acompanhou o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, que, após analisar o processo de 180 mil páginas, concluiu pela responsabilidade dos acusados no esquema ilícito.
Por maioria, a Corte Especial condenou Marcos Pinto da Cruz a 20 anos e três meses de reclusão, em regime inicial fechado, pelos crimes de associação criminosa, peculato, corrupção passiva e ativa e lavagem de dinheiro.
A Corte Especial acompanhou o voto da relatora para condenar os desembargadores a penas que variam de dez anos e cinco meses a 20 anos e três meses de prisão.
No caso de José da Fonseca Martins Junior e Fernando Antonio Zorzenon da Silva, as penas foram de 16 anos e três meses de reclusão e de dez anos e cinco meses de reclusão, respectivamente, conforme proposto pela relatora. A Corte Especial também acompanhou a ministra na decretação da perda do cargo público dos três magistrados. Um quarto réu, o desembargador Antonio Carlos de Azevedo Rodrigues, foi absolvido de todas as acusações por unanimidade. Os quatro continuam afastados do tribunal até que a decisão se torne definitiva.
Esquema envolvia pagamento de propina através de escritórios de advocacia
A investigação do Ministério Público Federal (MPF) revelou que a propina era operacionalizada por meio da contratação de escritórios de advocacia indicados pelos desembargadores. De acordo com os investigadores, o esquema beneficiava organizações sociais e empresas com dívidas trabalhistas e créditos a receber do governo do estado do Rio de Janeiro, onde fica a sede do TRT1.
O desembargador Marcos Pinto da Cruz teria procurado Edmar Santos, ex-secretário estadual de Saúde, para garantir que, em vez de o estado pagar diretamente às organizações, os valores fossem depositados judicialmente para quitar os débitos trabalhistas, mediante a inclusão das entidades no plano especial de execução. Como contrapartida, as organizações eram obrigadas a contratar escritórios de advocacia indicados pelos desembargadores, que repassavam parte dos honorários ao grupo criminoso.
A atuação da organização criminosa teria contado ainda com o apoio de dois ex-presidentes do TRT1, os desembargadores Fernando Antonio Zorzenon da Silva e José da Fonseca Martins Junior.
Pagamento de honorários como meio de dissimular propinas
Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi ressaltou que os integrantes da organização criminosa utilizaram o pagamento de honorários advocatícios como meio para dissimular a propina. Segundo a ministra, as provas produzidas em juízo demonstram que as vantagens indevidas foram oferecidas ao ex-governador Wilson Witzel e ao ex-secretário Edmar Santos, com o objetivo de desviar dinheiro público para interesses particulares (ambos estavam incluídos na denúncia, mas, após o desmembramento do processo, ficaram no STJ apenas os quatro desembargadores, devido ao foro por prerrogativa de função).
"O conjunto probatório revela-se coeso, harmonioso e evidencia a sincronia da ação de corruptos e corruptores no mesmo sentido da prática criminosa comum, dado que conduz à comprovação do delito imputado pelo MPF", disse.
Nancy Andrighi explicou que os valores oriundos dos crimes de corrupção passiva e peculato-desvio foram transformados em ativos aparentemente lícitos por meio do pagamento de honorários advocatícios. Segundo ela, esses valores, após a operação inicial, foram rapidamente transferidos para Marcos Pinto da Cruz e, posteriormente, retirados do sistema bancário para serem repassados ao acusado José da Fonseca Martins Junior e a outros codenunciados.
Provas demonstram instalação de associação criminosa de altíssimo vulto
A relatora ainda enfatizou que a materialidade dos fatos demonstra que a prática criminosa não se restringiu a atos isolados, mas foi meticulosamente planejada e executada em um esquema altamente articulado para a obtenção e ocultação de recursos ilícitos. "Na mesma medida, não é possível defender a existência de mero concurso de pessoas, pois não se está a tratar de simples soma de partes integrantes para o cometimento de crime", afirmou.
Nancy Andrighi reforçou que o caso revela uma associação criminosa de elevada complexidade, integrada por desembargadores, advogados e membros do Poder Executivo estadual, que atuavam de forma coordenada na prática de crimes como corrupção ativa e passiva, peculato e lavagem de capitais. Para a relatora, as provas reunidas demonstram não apenas a existência de um esquema ilícito, mas também a sofisticação do modelo adotado, caracterizado por uma estrutura bem definida, com cooptação estratégica e divisão de funções entre os envolvidos.
"O conjunto de provas carreadas aos autos demonstra a instalação de associação criminosa de altíssimo vulto no Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região, estruturalmente formada para a venda de decisões judiciais em troca do pagamento de propina, com prejuízo do erário e de inúmeros jurisdicionados", concluiu a ministra.
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