Você não precisa experimentar um sofrimento extraordinário ou ser
injustiçado de maneiras incrivelmente terríveis para sentir a forte e
aparentemente insuportável atração do ressentimento. Tudo o que precisa é
viver um pouco neste mundo caído. Em pouco tempo, você terá uma boa e
sólida razão para estar ressentido com alguém. Frequentemente, é alguém
bem próximo a você. Membro da família, cônjuge, pai, amigo de longa
data, etc. Parece impossível amar aquela pessoa.
O que causa esta amargura? Por que nossos corações estão imutavelmente amortecidos em relação àquela pessoa?
Bem, eles te injustiçaram, então você se ressente delas. Elas machucaram
você. Fizeram o que nunca deveriam ter feito. Ou não fizeram o que
deveriam ter feito. E você leva as feridas.
Sim – mas qual é a razão por trás da razão?
A razão fundamental é seu senso de justiça dado por Deus – em si, algo
bom. Você foi injustiçado e você, criado à imagem de Deus, portanto, com
um senso de justiça e igualdade funcionando corretamente, clama que a
justiça seja feita. O campo de jogo deve ser equilibrado. A justiça
exige.
O problema é que como um cidadão que segue às leis, você sabe que não
pode fazer algo físico contra eles, não importa o quanto deseje (vamos
ser honestos sobre isso, certo?) E, como cristão, você sabe que não pode
fazer nada verbal ou público contra eles (talvez simplesmente porque
prefere manter sua reputação e deixá-los em paz que executar a vingança e
perder sua reputação; o ídolo maior vence o menor).
Então, o que acontece? Para onde um coração vazio do Evangelho vai em um
caso assim? Aqui está o que acontece: ao invés de fazer algo externo
para ferí-los, você faz algo interno. Você nutre amargura. Esta é a
psicologia do ressentimento. Você executa punição emocional sobre eles
internamente quando a punição real não pode ser executada externamente.
Você monta um tribunal em seu coração, uma vez que um tribunal real é
impraticável.
Mas veja o que acontece. A amargura que você nutre, o castigo emocional
que exige em seu coração, com o passar do tempo, tem precisamente o
efeito oposto ao que você espera. A amargura não faz nada contra o
ofensor, enquanto silenciosamente destrói o ofendido. Ressentimento
mata, corrói, o ressentido, não o ofensor.
Como, então, vencemos a amargura?
Ao mergulharmos em duas realidades.
Primeiro, Deus é o juíz. Ele tem um tribunal. Um tribunal de verdade. E
um dia, todas as pessoas na face da terra que não estão em Cristo serão
réus. A Bíblia diz que mesmo os cristãos, um dia, auxiliarão Deus no
julgamento do mundo, julgando inclusive os anjos. Eventuais justiça,
equidade, correção dos erros são gloriosamente inevitáveis. Seu dia de
julgar seu ofensor está vindo. Mas não é hoje. Você usará o martelo. Mas
não hoje. Se você procura exercer julgamento prematuro, isso te
destruirá.
Segundo, e mais crucial, você mesmo ofendeu a Deus. E continua a
ofendê-lo de centenas de maneiras de que você está ciente e milhares que
você não está, todos os dias. Mas ele não guarda amargura contra você.
Ele não está ressentindo com você. Ele enviou seu Filho por você. Ele
decidiu abandonar qualquer razão para ressentir-se de você. Perdoados
disto, como poderíamos nos ressentir dos outros?
Veja o que diz “Sobre o Perdão”, de C. S. Lewis:
Ser um cristão significa perdoar o indesculpável, porque Deus perdoou o
indesculpável em você. Isso é difícil. Talvez não seja tão difícil
perdoar uma grande injúria de uma simples pessoa. Mas perdoar as
provocações incessantes da vida cotidiana – continuar a perdoar a sogra
mandona, o marido abusivo, a esposa ranzinza, a filha egoísta, o filho
mentiroso – como conseguimos? Somente, creio, lembrando onde
permanecemos, sendo sinceros em nossas palavras quando oramos a cada
noite ‘perdoa nossas dívidas como perdoamos os nossos devedores’. Perdão
nos é oferecido nestes termos. Recusar é recusar a misericórdia de Deus
por nós mesmos.