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segunda-feira, 8 de abril de 2013

Lima Netto diz que tinha outro modelo

CSN - 20 anos da privatização

A privatização permitiu transformar a CSN, uma estatal anacrônica, em empresa competitiva e valiosa. Isso não se discute. A coisa muda de figura, porém, quando se analisa o processo de privatização em si e, especialmente, suas consequências para a cidade do aço, como Volta Redonda se tornou conhecida por abrigar a siderúrgica projetada por Getúlio Vargas para inserir o Brasil na era da industrialização.

Para que a venda se tornasse possível, foi preciso submeter a companhia a um profundo e traumático processo de saneamento, que teve início em 1990, quando, ainda no governo Fernando Collor, o engenheiro Roberto Procópio Lima Netto foi designado para a presidência da companhia. Ele tomou posse em abril de 1990, permanecendo no cargo por quase três anos. Para muitos moradores de Volta Redonda, especialmente os que perderam o emprego, Lima Netto virou sinônimo não apenas de demissão e da privatização, mas também da forma como ela se deu.

Pois, surpreendentemente, duas décadas depois, o engenheiro afirma que, se dependesse dele, o modelo de venda da CSN teria sido outro. "A privatização era a única saída. O que questiono é como foi feita", disse Lima Netto ao FOCO REGIONAL. Ele conta que teve uma conversa com o então governador Leonel Brizola para propor que defendessem o que chama de "privatização popular", em que os empregados controlariam a CSN.

- Em princípio o Brizola aceitou e, por outro lado, consegui com o governo que o Clube de Investimentos da CSN (formado para que os empregados participassem do processo) pudesse comprar até 20% das ações. Com a CBS Previdência (fundo de pensão dos empregados) seria possível ter o controle. Com 45% os empregados controlariam a empresa, o restante seria pulverizado. A CSN pertenceria aos empregados – afirmou.

Segundo ele, a proposta não avançou por dois motivos: foi demitido da presidência quando Itamar Franco assumiu o governo e porque Brizola "mudou de opinião". Lima Netto enfatiza que o modelo proposto por ele foi adotado na Usiminas, apesar de na siderúrgica mineira a participação dos empregados ter sido limitada a 10%. Mesmo assim, eles tiveram a maior parte das ações por um longo tempo. "Foi uma pena ter dado errado. Seria a única (empresa) no Brasil com este modelo, que poderia servir para outras", lamentou Lima Netto, que, franco como de hábito, ainda hoje critica o também engenheiro Sebastião Faria, seu sucessor na presidência da CSN e que estava no cargo quando se deu a privatização.

- O Faria não queria a privatização. Tanto que o Clube de Investimentos comprou 11% das ações. Ele poderia ter viabilizado para que comprasse 20% – declarou.

Lima Netto garante ainda que era contra a inclusão de todo o patrimônio da siderúrgica no leilão. "Não fui favorável que tenha sido deste modo, mas depois que saí (da presidência) fiquei à margem. Poderia ter sido feita a doação de terrenos para a prefeitura. Em termos de valor da siderúrgica, esses terrenos não valem nada", comentou.
Divulgação
Lima Netto: Engenheiro comandou processo de reestruturação para viablizar venda da CSN
Demissão deixou mágoa

Vinte anos podem ter sido suficientes para amenizar, mas não foram suficientes para apagar a mágoa que Lima Netto carrega por também ter sido demitido da CSN quando Itamar se tornou presidente da República. Em síntese, ele não se conforma por não ter sido reconhecido seu esforço de sanear a companhia, enfrentando a ira de vários setores de Volta Redonda e do meio sindical de todo o país, que lhe renderam, e à sua família, até ameaças de morte. Mais: perdeu o posto depois de a CSN bater recorde de produção ainda como estatal.

- É claro que isso me magoou muito – declarou, revelando que um dos "braços direitos" de Itamar era amigo de Sebastião Faria, que o sucedeu no cargo. Garante até que, quando caiu, já tinha o apoio dos empregados, apesar de todos os cortes que promoveu.

Hoje atuando como consultor, mas dedicando a maior parte do tempo a escrever (principalmente em seu blog, no endereço happinessacademyonline.org), Lima Netto, aos 73 anos, é enfático ao afirmar que jamais mentiu para os empregados ao propagar que, adquirindo ações da CSN para a privatização, todos ficariam ricos. "Eles iam ficar ricos, sim. O (então) ministro (Ozires Silva) queria que eu vendesse Casa de Pedra à Vale por US$ 200 milhões e não aceitei, porque a mina era estratégica para a siderúrgica. Posteriormente, a mina foi retirada da CSN sem que os empregados ganhassem um centavo e hoje deve valer uns US$ 10 bilhões".

Segundo ele, os metalúrgicos que compraram as ações da empresa acabaram vendendo porque o Clube de Investimentos perdeu força ao ser dominado por Benjamin Steinbruch e pela cultura imediatista do trabalhador brasileiro de ganhar dinheiro.

Questionado pela privatização ter deixado um imenso passivo social em Volta Redonda, Lima Netto disse que a compensação viria através da geração de empregos com o cinturão de fornecedores que ele criou, mas que acabou sendo desfeito: "O cinturão já estava gerando três mil empregos e poderia gerar muito mais, com mais atividade econômica". Ele admitiu que ficou, sim, um grande passivo ambiental, mas acredita que, sendo a empresa privada, é mais fácil enfrentar a questão.

O distanciamento da CSN em relação à cidade também foi comentado pelo ex-presidente da empresa, que disse não entender por que a sede administrativa foi levada para São Paulo: "Não sei o que se pode fazer em São Paulo que não se possa fazer no Rio ou em Volta Redonda". Sobre o controlador da CSN, Lima Netto – que após a privatização chegou a ocupar a presidência novamente por um certo período – disse que o mercado tem medo dele. "Seu objetivo é só gerar dividendos e pagar seus empréstimos".

Autor do livro "A Volta por Cima", em que narra sua experiência na siderúrgica pela complexidade da missão que recebeu, o engenheiro, contudo, repete que a única saída para a CSN era a privatização: "Se depois de saneada a empresa permanecesse estatal, os problemas voltariam: ia começar a ter prejuízo, ia encher de gente de novo e quebraria outra vez". Errado, de fato, ele não está.

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