Entrevista: brasileiro defensor do Wi-Fi livre cobra inovação no País
A contradição preço alto vs. qualidade baixa da internet no
Brasil faz com que o povo daqui adore um Wi-Fi gratuito. No começo do
ano passado, um brasileiro enxergou que havia nessa constatação uma
oportunidade de negócio e agora ele se prepara para colher os primeiros
frutos de sua ideia. Mesmo que tudo tenha começado por acaso.
Aleksandar Mandic não é um empreendedor convencional.
Prestes a completar 60 anos, o brasileiro com sangue sérvio e
bielorrusso superou a falta de diploma superior com experiência de
trabalho. A partir da década de 1970 passou quase 20 anos na Siemens,
depois fundou a Mandic BBS e fez fama e fortuna apostando na embrionária
internet dos anos 90, quando transformou a empresa em Mandic Internet
após uma sociedade com o GP Investimentos.
Tornou-se,
em 2000, um dos fundadores do portal iG, mas dois anos depois decidiu
reabrir a Mandic, dessa vez com foco no mercado corporativo, e a
experiência deu tão certo que lhe rendeu R$ 100 milhões em 2012, quando
ele passou a empresa à Riverwood Capital - de quem se tornou sócio
minoritário.
Antes, em 2010, Aleksandar se candidatou a deputado federal
para tentar distribuir internet à população via Wi-Fi e acabou não
conseguindo o cargo. Hoje ele continua na Mandic como consultor, mas
desde março de 2013 vem dando atenção à quarta iniciativa que ele lança
com seu sobrenome. A bola da vez é o aplicativo Mandic magiC,
curiosamente um bom companheiro de quem precisa usar o Wi-Fi gratuito de
bares, cafés, restaurantes etc.
O app funciona como depositório público de senhas. A pessoa
vai à padaria X, pede a senha a um atendente e a registra no Mandic
magiC; assim, os demais visitantes não precisam consultar os atendentes,
basta procurarem a postagem daquela primeira pessoa. Um mapa dos
arredores mostra os locais e as respectivas senhas e, se houver erro,
qualquer um pode fazer edições para que os próximos não tenham
problemas.
Mas nada disso foi planejado. Aleksandar diz não ter
idealizado o Mandic magiC para ganhar dinheiro, e sim para facilitar a
própria vida. Como viaja muito, ele tinha o costume de anotar as senhas
de Wi-Fi públicos por onde passava e percebeu que um aplicativo
facilitaria o trabalho; então seu amigo Eduardo Mauro criou o programa,
que com o tempo fez sucesso e agora é um hit nas lojas de aplicativos.
Foi uma solução tão caseira que até o nome e o slogan "Não tem segredo"
foram pensados despretensiosamente - o magiC tem cê maiúsculo, por
exemplo, porque Aleksandar acreditava que isso chamaria atenção.
O Olhar Digital bateu um papo com o empreendedor e conta melhor essa história.
O aplicativo revela uma coerência no seu
pensamento, porque de certa forma facilita o acesso à internet, uma
bandeira da sua campanha quando tentou ser deputado. É possível associar
uma coisa a outra ou a criação do magiC foi um acaso total?
Foi um acaso total porque eu fiz pra mim, é a mesma
história dos anos 1990, eu não montei o BBS pensando na internet, mas
sim na troca de arquivos. Como eu viajo muito e eu não falo inglês, se
nos Estados Unidos me disserem a senha eu posso não entender. Eu montei
pra mim e essa coisa disparou. Aí mudamos de ideia: não é mais só pra
mim. Não quero igualar o Mandic magiC a Waze, WhatsApp, serviços
consagrados, mas ele vai ter o seu lugar.
A idealização e desenvolvimento do aplicativo foram
extremamente simples e ele tem dado certo; o ponto forte parece ter
sido mesmo a ideia. O magiC pode servir de exemplo para quem pensa em
criar um serviço no Brasil?
O mundo corre muito em volta das social networks, como
Facebook e Twitter, e isso [o magiC] é um serviço social de senha, que
Facebook, Twitter não têm. Essas redes sociais de hoje têm muita
carência em outros serviços. Por acaso o Mandic magiC ocupou um nicho,
mas existem outros nichos órfãos. Existem nichos mais óbvios, como
reservas em hotéis e pedidos de táxi, por isso eles enfrentam mais
concorrência; o de senha parecia menos óbvio.
Quando eu baixei o aplicativo, tive certeza de que
havia sido pensado por um brasileiro, porque ele se foca numa situação
local. O Mandic magiC faz mais sucesso aqui ou em outros países?
Faz no mundo todo. Mas duas características daqui favorecem
o aplicativo: 3G instável e conectividade cara - aqui muita gente nem
tem plano de dados. México, Colômbia, Chile, Argentina também são assim.
Nos Estados Unidos não é, na Alemanha, Japão também não, nesses lugares
a conectividade é barata e boa. Nos países com infraestrutura mais
precária o Mandic magiC está bem, ou seja, quase todo o mundo.
É comum surgirem aplicativos brasileiros
semelhantes a outros que já fazem sucesso pelo mundo, você acha que
falta um pensamento caseiro aos desenvolvedores e empresários daqui?
Eu sempre fui mais atrás do inédito. Eu criei o Mandic
magiC porque não existia alguma coisa semelhante e de qualidade. Não
achei o aplicativo dos meus sonhos e resolvi criar o meu.
Existem quantos usuários e qual é a plataforma preferida deles?
Atualmente estamos perto de 5 milhões de usuários, sendo
que a base cresce em cerca de 35 mil pessoas por dia. O Android é a
plataforma preferida. Há algo entre 70% e 80% de usuários no Brasil e
20% ou 30% no resto do mundo, sendo que os países onde o aplicativo faz
mais sucesso são Mexico, Portugal, Egito, Arábia Saudita e Marrocos
Você já foi sondado para vender o serviço, certo? Quanto ele vale hoje?
Não para vender, mas estamos negociando uma sociedade num
negócio, eu não vou sair. Negociamos um aporte de capital pra decolar
rápido e a avaliação está em US$ 50 milhões - justamente o que a gente
está negociando, essa é a briga agora, mas não posso dizer nomes.
E ainda assim você não ganha um centavo com o
Mandic magiC (apesar de também não gastar). O que falta para monetizar a
ferramenta?
Não tem receita mas não tem despesa. Os downloads são
feitos pelas próprias lojas, a página é o Facebook, não temos
escritório, ou seja, só estou queimando conhecimento e tempo, não
dinheiro. O brasileiro tem que levar isso em conta, ele quer o dinheiro
muito rápido, mas isso nem sempre é o importante. Para nós o importante
agora é ter um produto de qualidade. Dá para ganhar dinheiro com
qualquer coisa no mundo, basta ter tamanho; por exemplo, num balde de
lixo e um aterro sanitário o conteúdo é o mesmo: lixo, mas o aterro dá
dinheiro porque é grande.
Você já tem parcerias na manga para incrementar o aplicativo?
Estamos conversando com dois serviços, vai sair em breve.
Este ano saem pelo menos duas parcerias. Temos planos de agregar outros
serviços que sejam sinérgicos, como pedidos de táxi, reserva de hotel,
entre outras coisas.
Já tem outras ideias de serviços que possam aparecer no mercado em breve?
Eu me concentro, sou monogâmico. Só vou me concentrar no
Mandic magiC, não adianta atirar em várias coisas ao mesmo tempo, meu
foco hoje é o Mandic magiC. O investidor tem de comprar 10 empresas
porque duas vão dar certo, eu não, nem tenho dinheiro pra isso.
Se você pudesse dar um conselho aos desenvolvedores brasileiros, o que diria?
Não espere resultados diferentes se você faz sempre a mesma coisa. Vamos inovar, porque empreendedorismo é inovar.
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